domingo, 10 de fevereiro de 2008

A Mangueira não é mais a mesma

Na chegada a São Paulo, pelo menos três pessoas me perguntaram a razão de a Mangueira ter ficado numa colocação tão ruim no Carnaval deste ano - ficou em décimo lugar. Perguntaram se a escola fez uma apresentação ruim, se cometeu erros etc. A escola não estava ruim e tecnicamente não cometeu erros. Porém, o erro cometido pela Mangueira, pelo menos aos meus olhos, é que a escola esqueceu sua história, sua tradição. O samba era bom e tinha muita coisa bonita para se ver no desfile, mas não era a Mangueira. Estava irreconhecível.

A Mangueira trouxe o enredo sobre os 100 anos do frevo, mas se esqueceu que uma figura muito mais importante para a escola - e para o samba - também completaria 100 anos em 2008 caso estivesse vivo: Cartola. Para mim, esse foi o primeiro erro da Mangueira.

Cartola, um sambista maior até mesmo que o samba, foi lembrado somente no último carro da escola. Mas essa foi uma lembrança de última hora, e desconfio que foi só porque a Viradouro o homenageou na letra do samba e em seu enredo. O refrão do samba da Viradouro lembrou a música mais conhecida de Cartola, As Rosas não Falam, e dizia "Bate outra vez o meu coração / Pois já vai terminando o verão / As rosas não falam / Na Viradouro exalam o perfume de uma canção".

A escola de Niterói também colocou no último carro uma linda escultura do compositor, com várias flores animadas e, como único destaque, Beth Carvalho. A mesma Beth Carvalho que foi desprezada pela Mangueira no ano passado. Em 2007, a escola não deixou a intérprete subir no carro que trazia os baluartes.

Ao não cantar Cartola, a Mangueira mostrou que está mais em busca de patrocínio do que outra coisa, pois recebeu uma boa verba do governo pernambucano para desenvolver o enredo sobre o frevo, ritmo típico do Estado.

Imagino que talvez a morte de Dona Zica e de outros personagens tão importantes da Mangueira tenha feito a escola perder o rumo. Jamelão faz muita falta também. Pelo segundo ano consecutivo não interpretou o samba por estar doente, debilitado. Embora o intérprete Luizito tenha realizado um bom trabalho, a escola está com uma voz diferente, mais parecida com as outras agremiações. O samba está mais rápido, e a bateria da escola tem feito coisas até então inconcebíveis para a ala dos ritmistas da verde e rosa.

Mesmo com outro intérprete, a escola tem de manter sua identidade. Todas as escolas mantêm sua personalidade, independente de terem esse ou aquele carnavalesco ou intérprete do samba. Faltou à Mangueira, portanto, a magia típica que a faz uma das maiores escolas do Rio de Janeiro. A Mangueira não é mais a mesma. Cartola, que nunca teve um enredo o homenageando, que o diga.

* Andrea Catão

3 comentários:

Anônimo disse...

Andrea, além das razões que vc expôs para o fracasso da verde-e-rosa não podemos esquecer o envolvimento da escola com o tráfico de drogas, fato que veio à tona recentemente. Um dos compositores do samba deste ano, Francisco do Pagode, o Tuchinha, que está foragido, chegou a ser procurado pela PF durante o desfile na Sapucaí no domingo. Isso certamente

Anônimo disse...

(continuando comentário anterior)...contribuiu para o desempenho pífio da Mangueira, que estava abalada moral e psicologicamente. Em relação a Cartola, o saudoso compositor e cantor foi o enredo da Paraíso do Tuiuti, que desfilou na terça de Carnaval e foi a segunda colocada do Grupo de Acesso B. Juntamente com a Inocentes de Belford Roxo, ela subiu para o Grupo de Acesso A.

Unknown disse...

Num documentario apresentado essa semana no Canal Brasil, Tantinho da Mangueira, o maior compositor de sambas de terreiro da escola, disse um tanto quanto triste que a Mangueira ainda é o motivo maior da sua existência aqui entre nós. Disse ainda que os Sambas estão casa vez mais mecanizados e que seus sambas de terreiro sairam de "moda". Digo triste porque fala com saudades de uma época unica, onde o samba, o evento samba, ainda era um prazer. Porém ainda há movimentos como dantes, projetos encabeçados por ele mesmo que trata o samba da maneira como ele deve ser tratado:COM RESPEITO.